Zoara Failla*
O dia das mulheres não deve ser somente para festejar, deve ser também uma data de reflexão sobre as conquistas e sobre as injustiças.
A pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, realizada em parceria pelo Instituto Pró-Livro com o Itaú Cultural, nos traz dados que nos ajudam nessa reflexão.
Apesar de 10% das mulheres e 7% dos homens, segundo o PNAD de 2018, terem nível superior, as mulheres continuam ganhando menos e ocupando poucos cargos de direção ou de decisão. Além de melhor escolaridade, é entre as mulheres que encontramos mais leitoras de livros (54%, e, homens 46%). Somos 54,2 milhões de leitoras. Nove milhões a mais do que os 45 milhões de leitores homens, o que, certamente, movimenta o mercado editorial e pode explicar, em parte, porque as mães são mais citadas do que os pais, quando perguntamos aos leitores quem despertou seu gosto pela leitura. E a diferença é grande quando olhamos por faixa etária: 28%, entre 5 e 10 anos, citam as mães, enquanto somente 5% citam os pais.
Esses leitores também dizem que viam as mães lendo mais do que os pais (59% elas e 42% eles), e que mães liam mais para esses leitores.
Mas, as mulheres também leem mais livros de literatura (56% mulheres X 44% homes) e mais livros digitais, do que os homens.
Esses poucos dados que buscamos na Retratos escancaram a importância da mulher, e das mães, no despertar do gosto pela leitura. Difícil dimensionar o impacto desse relevante papel social, enquanto formadora de leitores e de cidadãos, na educação e no desenvolvimento social e humano do nosso país, mas certamente não deixa dúvidas.
Nesse dia trazemos nossa homenagem e nosso agradecimento à essas especiais formadoras de leitores e de cidadãos, mas não podemos deixar de registrar, também, nossa indignação pelo aumento no feminicídio e na violência contra as mulheres; pela discriminação e a falta de oportunidades iguais no mercado de trabalho.
A luta por mais direitos já dura mais de um século, e, as conquistas veem a conta gotas. Nessa data é bom lembrar um pouco dessa história:
No Dia Internacional da Mulher, comemoramos as conquistas, que foram conseguidas com muita luta, desde o final do século 19, com a Revolução Industrial, quando as mulheres trabalhavam 15 horas diárias; a deflagração de greves a partir de 1908; e, em 1911, conta a história, aconteceu uma grande manifestação, quando cerca de 130 operárias morreram em Nova York carbonizadas em uma fábrica têxtil. Mas foi em 8 de março de 1917, quando cerca de 90 mil operárias saíram às ruas para protestarem contra o Czar, as más condições de trabalho, a fome e a participação russa na Primeira Guerra Mundial – em protesto conhecido como “Pão e Paz” – que a data se consagrou como Dia Internacional da Mulher. A data foi reconhecida e oficializada pela ONU somente em 1975, após o movimento feminista ganhar corpo a partir de 1960.
Ao comemorarmos as conquistas de direitos e as contribuições para a formação das novas gerações, não podemos deixar de registrar que é uma data também de mobilização para não sofrermos retrocessos revestidos de falsos moralismos e da negação do papel da mulher na construção de uma sociedade mais leitora, mais justa, mais humana, mais democrática e desenvolvida.
Parabéns a todas as mulheres leitoras e que formam leitores e, assim, contribuem para a formação de uma sociedade mais humana.
Zoara Failla é socióloga, gerente de projetos do Instituto Pró-Livro e coordenadora da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, maior levantamento sobre o comportamento leitor no país.