No dia 22 de setembro, o Instituto Pró-Livro e o Itaú Cultural inauguraram o “Ciclo de Debates: o que nos diz a 5ª edição da Retratos da Leitura no Brasil”. O primeiro encontro contou com as participações de José Castilho Marques Neto (Unesp e J.Castilho Consultoria), Idmea Semeghini-Siqueira (USP) e Marisa Lajolo (Mackenzie). Zoara Failla, coordenadora da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, mediou o encontro e apresentou alguns dados que fomentaram as discussões realizadas no evento.
De acordo com os dados da pesquisa, atualmente o Brasil conta com 52% de leitores (ou 100,1 milhões de pessoas), o que representa uma diminuição de aproximadamente 4,6 milhões de leitores em relação à edição anterior da pesquisa, de 2015, quando o percentual de leitores era de 56%.
Com exceção da faixa etária entre 5 a 10 anos, que apresentou um acréscimo de 4 pontos percentuais na proporção de leitores, todas as outras faixas de idade apresentaram estabilidade ou decréscimo na proporção de leitores entre as duas edições da pesquisa.
As principais reduções ocorreram entre adolescentes de 14 a 17 anos e jovens de 18 a 24 anos e entre indivíduos com nível de escolaridade médio e superior. O decréscimo atingiu também todas as faixas de renda familiar. “Houve aumento do número de leitores de 5 a 10 anos, e eles leem por gosto. Mas deixam de ler após os 11 anos: o que pode explicar o desencanto? E como despertar o gosto na infância? A Retratos diz que a família é o principal influenciador, mas e as famílias mais vulneráveis? Como garantir o encantamento pelos livros nas escolas públicas?”, questiona Zoara.
O que aconteceu nas políticas públicas nos últimos anos e a incidência delas na pesquisa
Em seguida, José Castilho Marques Neto comentou em sua apresentação o que revela a série histórica da Retratos da Leitura sobre as políticas públicas do livro e leitura no Brasil. De acordo a pesquisa, o número de leitores no Brasil diminuiu em 4,6 milhões em 4 anos, mesmo período em que, segundo o palestrante, as políticas do livro e leitura sofreram cortes abruptos. “A partir de 2016, tivemos um início de uma mudança radical de investimentos de governo e a extinção do Ministério da Cultura e dos programas de leitura”.
Para Castilho, o decréscimo representa o retrato da exclusão social no Brasil, do direito dos brasileiros à leitura e à cidadania plena. “Nós somos também na leitura um país dividido entre aqueles que conseguiram conquistar o seu direito à leitura e aqueles que não conseguiram. E infelizmente eles são maioria. A Retratos coloca para o Brasil o seu retrato nu e cru de sua própria história enquanto nação. Nós somos um país com uma história muito oscilante do ponto de vista das políticas para termos uma sociedade que vai valorizar os sujeitos e não os números”, afirma.
Desafios para a formação de leitores no Brasil: em foco as crianças a partir da Retratos
Idmea Semeghini-Siqueira comentou dez questões fundamentais que ajudam a entender os principais desafios para a formação de leitores no Brasil. “A leitura é um direito necessário de todo cidadão, fundamental para a formação de seres humanos plenos e capazes de usar a imaginação. No entanto, temos que ir muito além de afirmar que se trata de um direito”, diz.
A professora da Faculdade de Educação da USP também explicou o que ocorre com as crianças das classes mais vulneráveis desde pequenas com relação ao letramento emergente e quais causas relacionadas interferem no seu desenvolvimento. “Essas crianças não tiveram acesso a vivências básicas para desenvolver influência ao ler. E, ao não ser competente, ao não ter fluência, como é possível gostar de ler?” diz. “O processo lúdico de letramento emergente aumentará sua probabilidade de sucesso escolar nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Se ocorrer letramento emergente lúdico, o processo de alfabetização não será sofrido, não deixará estigmas que provoquem dificuldades e o não gostar de ler”.
Hábitos, motivações e o que leem os brasileiros
Em sua análise sobre os hábitos de leitura dos brasileiros, Marisa Lajolo chamou a atenção para a diversidade de tipos de literatura que os brasileiros afirmam consumir e sugeriu que esses dados sejam cruzados com os levantamento dos livros mais vendidos, feitos recorrentemente pela Câmara Brasileira do Livro (CBL). “É uma mistura de Dom Casmurro com Harry Potter, de A culpa é das estrelas com Cinquenta tons de cinza, então eu acho que o leitor que essa pesquisa nos fornece está nos pedindo com urgência que a gente se detenha um pouco para além dos algarismos que ela revela, para a qualidade dos textos que ela mostra ou que os pesquisados dizem que leem; para que a gente possa imaginar quais são as representações efetivas de leitura que eles operam”.
Para isso, Marisa propôs uma segunda etapa de pesquisa que traga informações qualitativas sobre como esses livros são lidos. De acordo com ela, essas informações sobre os autores que os brasileiros mais gostam poderiam ajudar os agentes envolvidos com a formação de leitores a ampliar os números de brasileiros que consomem literatura no país.